Apelação na Ação Popular da CBF

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Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(a) Federal da Quinta Vara Cível da Justiça Federal de São Paulo

 

(JFSP PROTOCOLO 26/10/2004.000364726-1)

 

O importante não é vencer,
mas competir, e competir com dignidade”
(Barão de COUBERTIN)

 

Autos nº 1999.61.00.004400-0
Ação Popular
Cidadão: CARLOS PERIN FILHO
Rés: UNIÃO FEDERAL e Ots

CARLOS PERIN FILHO, residente na Internet, em www.carlosperinfilho.net (sinta-se livre para navegar), nos autos da actio popularis supra epigrafada, venho, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com base nos artigos 513 e seguintes do Código de Processo Civil, APELAR pela reforma da r. Sentença de fls. 84-90, conforme as RAZÕES que seguem, cuja juntada e remessa ao Tribunal ad quem ora fica requerida.

Vale lembrar que este popular Recurso é imune ao preparo, nos termos constitucionais (art. 5º, LXXIII).

São Paulo, 25 de outubro de 2004

 

 Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649

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Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região

 

Reparo merece o r. decisum do juízo singular, pois não logrou acompanhar como de costume o caminho do melhor Direito, conforme razões infra articuladas.

RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, ao doutrinar sobre a Ação Popular, ensina ser a compatibilidade da pretensão um importante elemento de aferição da própria (im)possibilidade jurídica do pedido, in verbis:

“Às vezes, é certo, a pretensão não encontra, exatamente, guarida em norma legal, mas é compatível como o sistema, cabendo lembrar que por ‘ordenamento jurídico’ não se entende apenas o arsenal normativo, mas todos os demais subsídios jurídicos que o integram: doutrina, jurisprudência, analogia, eqüidade, princípios gerais, regras de experiência. (p. 119)

(....)

A (im)possibilidade jurídica do pedido, portanto, enquanto condição impeditiva de conhecimento do mérito, deve ficar reservada para aquelas hipóteses em que evidentemente, aprioristicamente, à mera leitura da inicial já possa o julgador concluir que a pretensão não tem previsão sequer teórica no ordenamento ou, pior, que este a inibe expressamente. Assim pensamos, porque a cognição das condições da ação não envolve juízo de certeza, e sim de plausibilidade ou razoabilidade. (p. 121)

(In: AÇÃO POPULAR - PROTEÇÃO DO ERÁRIO, DO PATRIMÔNIO PÚBLICO, DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA, E DO MEIO AMBIENTE, 3ª ed., rev. e atual. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998)

Outro aspecto da r. Sentença a ser apelado é quanto à interpretação dada ao requisito da lesividade ao patrimônio público, pois é não apenas uma questão financeira pura e simples, de aferição por balanços de contabilidade ou planilhas de cálculo, mas sim em sentido amplo, como bem observa RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, in verbis:

“Nossa posição a respeito parte do princípio de que a lei não contém palavras supérfluas e o fato é que o texto constitucional não fala em ‘ilegalidade’ ou ‘ilegitimidade’, mas sim em ação popular que ‘vise a anular ato lesivo’. Quer dizer, a lesividade do ato há de ser, em princípio o leit motiv da ação, sua causa próxima mais evidente. Casos haverá (não serão a regra) em que tal seja a enormidade da lesão, que a ilegalidade virá por assim dizer ‘embutida’, presumida, ínsita na lesão mesma. Nesse sentido, José Afonso da Silva, em trabalho mais recente, escreve: ‘Na medida em que a Constituição amplia o âmbito da ação popular, a tendência é a de erigir a lesão, em si, à condição de motivo autônomo de nulidade do ato’. Hely Lopes Meirelles, a seu turno observa: ‘Na conceituação atual, lesivo é todo ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. E essa lesão tanto pode ser efetiva quanto legalmente presumida, visto que a lei regulamentar estabelece casos de presunção de lesividade (art. 4º), para os quais basta a prova da prática do ato naqueles circunstâncias, para considerar-se lesivo e nulo de pleno direito. (STF, RTJ 103/683).

(In: opus supra cit., p. 86-87)

No mesmo sentido, RICARDO DE BARROS LEONEL, ao elaborar Processo coletivo: evolução e perspectivas, evidencia que, in verbis:

5.5 Possibilidade jurídica do pedido

Como já anotado, a possibilidade jurídica do pedido deve ser compreendida no sentido negativo, como ausência de vedação no ordenamento da espécie de provimento que o autor pretende com a ação. Não pode ser contemplada no sentido positivo, como necessidade de expressa previsão da providência, sendo inviável exigir do legislador que estabeleça previamente, e de forma hipotética, pedidos em tese amoldáveis a todas as situações da vida. Havendo previsão (constitucional e infraconstitucional) da tutela dos interesses metaindividuais de forma exemplificativa, e sendo formulados pedidos não expressamente vedados (declaratórios, constitutivos, condenatórios, mandamentais etc.), não se pode acolher a alegação de que a demanda tenha sido aforada com base na eqüidade ou com objeto juridicamente impossível.

(....)”

(In: MANUAL DO PROCESSO COLETIVO - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 211)

Os detalhes técnicos que aparentemente tornam juridicamente impossível o processamento desta actio popularis serão tratados individualmente, acompanhando as paraconsistências (contradições não triviais) envolvidas.

Dispõe o artigo 47 do Código de Processo Civil, in verbis:

“Art. 47. Há litisconsorte necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinalar, sob pena de declarar extinto o processo.”

Neste sentido, peticionou este Cidadão Apelante, desde a exordial, pela citação do Excelentíssimo(a) Senhor(a) Ministro(a) de Estado Extraordinário dos Esportes, bem como da CONFEDERAÇÃO BRASILEIRA DE FUTEBOL, pois dimensiona o pólo passivo na medida dos interesses envolvidos.

Quanto às questões preliminares de composição do pólo passivo, vale lembrar as lições da professora titular de Direito Administrativo da velha e sempre nova Academia, MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO sobre a Teoria do Órgão, in verbis:

“Com base na teoria do órgão, pode-se definir o órgão público como uma unidade que congrega atribuições exercidas pelos agentes públicos que o integram com o objetivo de expressar a vontade do Estado.

Na realidade, o órgão não se confunde com a pessoa jurídica, embora seja uma de suas partes integrantes; a pessoa jurídica é o todo, enquanto os órgãos são parcelas integrantes do todo. O órgão também não se confunde com a pessoa física, o agente público, porque congrega funções que este vai exercer.

Nas palavras de Celso Antonio Bandeira de Mello (1975a:69), os órgãos mais significam que círculos de atribuições, os feixes individuais de poderes funcionais repartidos no interior da personalidade estatal e expressados através dos agentes neles providos”.

(In: DIREITO ADMINISTRATIVO, 10ª ed. - São Paulo: Atlas, 1998, p. 350)

Por não ter sido oportuna e adequadamente processada e conhecida a demanda em primeira instância restou em muito prejudicada a olímpica argumentação deste Cidadão - e a defesa dos interessas da olímpica Cidadania - no sentido de corrigir os atos administrativos reportados na exordial e em petições em andamento, sendo então jurisdicionalmente apreciados de forma equivocada na r. Sentença de fls. 84-90.

As regras constitucionais e legais que garantem o devido processo para defesa dos direitos da Cidadania restaram prejudicadas na prestação jurisdicional monocrática, merecendo revisão por este Egrégio Tribunal, numa interpretação pluralista e procedimental da Constituição Federal, como ensina o professor titular de Direito Público e de Filosofia do Direito da Universidade da Augsburg-RFA, PETER HÄBERLE, na versão brasileira ministerial de GILMAR FERREIRA MENDES, in verbis:

I. Situação atual da teoria

Da interpretação constitucional

A teoria da interpretação constitucional tem colocado até aqui duas questões essenciais:

- a indagação sobre as tarefas e os objetivos da interpretação constitucional, e

- a indagação sobre os métodos (processo da interpretação constitucional) (regras de interpretação).

Não se conferiu até aqui maior significado à questão relativa ao contexto sistemático em que se coloca um terceiro (novo) problema relativo aos participantes da interpretação, questão que, cumpre ressaltar, provoca a práxis em geral. Uma análise genérica demonstra que existe um círculo muito amplo de participantes do processo de interpretação pluralista, processo este que se mostra muitas vezes difuso. Isso já seria razão suficiente para a doutrina tratar de maneira destacada esse tema, tendo em vista, especialmente, uma concepção teórica, científica e democrática. A teoria da interpretação constitucional esteve muito vinculada a um modelo de interpretação de uma ‘sociedade fechada’. Ela reduz, ainda, seu âmbito de investigação, na medida que se concentra, primariamente, na interpretação constitucional dos juízes e nos procedimentos formalizados.

Se se considera que uma teoria da interpretação constitucional deve encarar seriamente o tema ‘ Constituição e realidade constitucional’ - aqui se pensa na exigência de incorporação das ciências sociais e também nas teorias jurídico-funcionais, bem como nos métodos de interpretação voltados para atendimento do interesse público e do bem-estar geral -, então há de se perguntar, de forma mais decidida, sobre os agentes conformadores da ‘realidade constitucional’.

2. Novo questionamento e tese

Nesse sentido, permite-se colocar a questão sobre os participantes do processo da interpretação: de uma sociedade fechada dos intérpretes da Constituição para uma interpretação constitucional pela e para uma sociedade aberta (von der geschlossenen Gesellschaft der Verfassungsintepreten zur Verfassungsinterpretation durch und für die offene Gesellschaft).

Propõe-se, pois, a seguinte tese: no processo de interpretação constitucional estão potencialmente vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível estabelecer-se um elenco cerrado ou fixado com numerus clausus de intérpretes da Constituição.

Interpretacão constitucional tem sido, até agora, conscientemente, coisa de uma sociedade fechadª Dela tomam parte apenas os intérpretes jurídicos ‘vinculados às corporações’ (zünftmässige Interpreten) e aqueles participantes formais do processo constitucional. A interpretação constitucional é, em realidade, mais um elemento da sociedade abetª Todas as potências públicas, participantes materiais do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade (... Weil Verfassungsinterpretation diese offene Gesellschaft immer von neuem mitkonstituiert und von ihr konstituiert wird). Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade.

(In: HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL - A SOCIEDADE ABERTA DOS INTÉRPRETES DA CONSTITUIÇÃO: CONTRIBUIÇÃO PARA A INTERPRETAÇÃO PLURALISTA E ‘PROCEDIMENTAL’ DA CONSTITUIÇÃO, Sergio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre, 2002 [reimpressão], p. 11-13)

Ainda com GILMAR FERREIRA MENDES, valem as considerações gerais e conclusões a seguir sobre as tendências e expectativas do Direito Desportivo, que também valem para sanar as nulidades administrativas apontadas nesta actio popularis, in verbis:

7. CONSIDERAÇÕES GERAIS

No que diz respeito à convocação de atletas, a legislação veio atender a um dos reclamos dos clubes quanto aos ônus que têm com os atletas, inclusive quanto à entrega de atletas que sofreram danos durante as atividades.

No que diz respeito à Justiça Desportiva, sabe-se que há uma preocupação em ter pessoas com um perfil técnico adequado para o seu funcionamento.

A Lei Pelé já se revela exitosa. Primeiro, porque ela cumpriu este objetivo que era o seu desiderato inicial: dar transparência ao processo de decisão no âmbito das entidades desportivas.

Já se apontaram defeitos e alguns, inclusive, terão de ser corrigidos. A solução conferida ao passe padece de uma omissão grave, pois se esqueceu de ressalvar a aplicação do dispositivo da CLT que trata do contrato por prazo determinado. Há a discussão que o Ministro Grecca encetou a partir de posições que a FIFA vem assumindo sobre o eventual controle acionário por parte de uma mesma empresa em relação a mais de um clube, o que geraria - sé isso já seria suficiente para contaminar todo o processo - suspeita de combinação de resultados, de conveniência de classificação, etc., com sérios danos para a imagem do desporto. Nesse ponto, vale ressaltar um dos acertos da lei. A possibilidade de intervenção do Ministério Público Por isso que é importante a presença no processo, até mesmo por esta forma difusa em controle com ações civis públicas, do Ministério Público.

A lei logrou executar este modelo de transparência, até nos seus defeitos. Logrou também engendrar um outro propósito que estava explícito na abordagem dos seus idealizadores, que era o de gerar uma gestão profissional do esporte e, a partir deste, um maior controle que a própria sociedade poderia ter sobre essas entidades. Nesse sentido, não há a menor dúvida de que se trata de uma proposta exitosa. O próprio interesse que se demonstra hoje pela discussão é uma prova insofismável disto.

8 . CONCLUSÃO

Certamente, muitas dúvidas hão de surgir, inclusive na aplicação da Lei. Muitas delas já estão sendo apontadas. O próprio Ministro do Esporte e Turismo, o Ministro Grecca, tem apontado a necessidade de revisão da lei: da questão do controle dos clubes por empresas. A FIFA está recomendando algum tipo de controle, isso numa economia globalizada está sendo um problema, até mesmo para competições internacionais e com todas as conseqüências. A questão do passe restou um pouco imperfeita, por conta da combinação involuntária entre dispositivos da lei especial e da CLT. O contrato por prazo determinado, aqui, não atinge o objetivo. O prazo de dois anos, na verdade, frustra o sistema que se queria ver superado. O prazo de vigência dilatado ainda permitirá uma tempestiva retificação.”

(Tendências e expectativas do Direito Desportivo in DIREITO DESPORTIVO - 1ª ed. - Campinas, SP: Editora Jurídica Mizuno, 2000, vários autores, p. 277-278)

Quanto ao nome deste inclemente Cidadão, favor esportivamente ver infra E.T.

Do exposto e sob a inspiração dos deuses gregos (*) requeiro a olímpica reforma da r. Sentença, com o retorno dos autos ao juízo a quo para o devido processo legal.

São Paulo, 25 de outubro de 2004, 182º da Independência,
115º da República Federativa do Brasil e 100º do Tratado de Petrópolis

 

Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649

E.T.:

Nome e assinaturas não conferem frente aos documentos apresentados com exordial em função da reconfiguração de direito em andamento, nos termos da ação popular de autos nº 98.0050468-0, ora em apelação, em autos sob nº 2000.03.99.030541-5 - www.trf3.gov.br -

(*) Sobre as históricas ligações entre a Filosofia, Ética, Política, os Esportes e a Administração Pública, favor ver artigo de NILCE DA SILVA e NEUZA DA SILVA, especial para o Jornal da USP de 3 a 9/5/2004, p. 13, nesta anexado, com o título “Sob a inspiração dos deuses gregos”. 


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