Apelação na Ação Popular da Greve
das Universidades Paulistas

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Excelentíssimo(a) Senhor(a) Doutor(a) Juiz(a) Federal da 12ª
Vara da Fazenda Pública de São Paulo

(DEPRI 18.1-FZPUB/AC.TRB-17-Nov-2004-003471-3/3)

Autos nº ( 1192 ) 053.04.019480-1
Ação Popular
Cidadão: CARLOS PERIN FILHO
Réu: ESTADO DE SÃO PAULO

CARLOS PERIN FILHO, residente na Internet, em www.carlosperinfilho.net (sinta-se livre para navegar), nos autos da actio popularis supra epigrafada, venho, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, com base nos artigos 513 e seguintes do Código de Processo Civil, APELAR pela reforma da r. Sentença de fls. 25-26, conforme as RAZÕES que seguem, cuja juntada e remessa ao Tribunal ad quem ora fica requerida.

Vale lembrar que este popular Recurso é imune ao preparo, nos termos constitucionais (art. 5º, LXXIII).

São Paulo, 17 de novembro de 2004

  

Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649

 

 

Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

 

 

Reparo merece o r. decisum do juízo singular, pois não logrou acompanhar como de costume o caminho do melhor Direito, conforme razões infra articuladas.

Em preliminar vale ressaltar que o andamento desta actio popularis foi prejudicado em primeira instância por outra greve, do Judiciário Paulista, conforme petição sob protocolo 011649, em 12.11.2004.

RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, ao doutrinar sobre a Ação Popular, ensina ser a compatibilidade da pretensão um importante elemento de aferição da própria (im)possibilidade jurídica do pedido, in verbis:

“Às vezes, é certo, a pretensão não encontra, exatamente, guarida em norma legal, mas é compatível como o sistema, cabendo lembrar que por ‘ordenamento jurídico’ não se entende apenas o arsenal normativo, mas todos os demais subsídios jurídicos que o integram: doutrina, jurisprudência, analogia, eqüidade, princípios gerais, regras de experiência. (p. 119)

(....)

A (im)possibilidade jurídica do pedido, portanto, enquanto condição impeditiva de conhecimento do mérito, deve ficar reservada para aquelas hipóteses em que evidentemente, aprioristicamente, à mera leitura da inicial já possa o julgador concluir que a pretensão não tem previsão sequer teórica no ordenamento ou, pior, que este a inibe expressamente. Assim pensamos, porque a cognição das condições da ação não envolve juízo de certeza, e sim de plausibilidade ou razoabilidade. (p. 121)

(In: AÇÃO POPULAR - PROTEÇÃO DO ERÁRIO, DO PATRIMÔNIO PÚBLICO, DA MORALIDADE ADMINISTRATIVA, E DO MEIO AMBIENTE, 3ª ed., rev. e atual. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998)

Outro aspecto da r. Sentença a ser apelado é quanto à interpretação dada ao requisito da lesividade ao patrimônio público, pois é não apenas uma questão financeira pura e simples, de aferição por balanços de contabilidade ou planilhas de cálculo, mas sim em sentido amplo (inclusive corrigindo as eventuais nulidades administrativos noticiadas pelo INFORME PUBLICITÁRIO assinado pelos(as) Professores(as) da USP, cf. petição DEPRI 18.1-FXPUB/AC.TRB-29-Set-2004.031167-1/3, como bem observa RODOLFO DE CAMARGO MANCUSO, in verbis:

“Nossa posição a respeito parte do princípio de que a lei não contém palavras supérfluas e o fato é que o texto constitucional não fala em ‘ilegalidade’ ou ‘ilegitimidade’, mas sim em ação popular que ‘vise a anular ato lesivo’. Quer dizer, a lesividade do ato há de ser, em princípio o leit motiv da ação, sua causa próxima mais evidente. Casos haverá (não serão a regra) em que tal seja a enormidade da lesão, que a ilegalidade virá por assim dizer ‘embutida’, presumida, ínsita na lesão mesma. Nesse sentido, José Afonso da Silva, em trabalho mais recente, escreve: ‘Na medida em que a Constituição amplia o âmbito da ação popular, a tendência é a de erigir a lesão, em si, à condição de motivo autônomo de nulidade do ato’. Hely Lopes Meirelles, a seu turno observa: ‘Na conceituação atual, lesivo é todo ato ou omissão administrativa que desfalca o erário ou prejudica a Administração, assim como o que ofende bens ou valores artísticos, cívicos, culturais, ambientais ou históricos da comunidade. E essa lesão tanto pode ser efetiva quanto legalmente presumida, visto que a lei regulamentar estabelece casos de presunção de lesividade (art. 4º), para os quais basta a prova da prática do ato naqueles circunstâncias, para considerar-se lesivo e nulo de pleno direito. (STF, RTJ 103/683).

(In: opus supra cit., p. 86-87)

No mesmo sentido, RICARDO DE BARROS LEONEL, ao elaborar Processo coletivo: evolução e perspectivas, evidencia que, in verbis:

5.5 Possibilidade jurídica do pedido

Como já anotado, a possibilidade jurídica do pedido deve ser compreendida no sentido negativo, como ausência de vedação no ordenamento da espécie de provimento que o autor pretende com a ação. Não pode ser contemplada no sentido positivo, como necessidade de expressa previsão da providência, sendo inviável exigir do legislador que estabeleça previamente, e de forma hipotética, pedidos em tese amoldáveis a todas as situações da vida. Havendo previsão (constitucional e infraconstitucional) da tutela dos interesses metaindividuais de forma exemplificativa, e sendo formulados pedidos não expressamente vedados (declaratórios, constitutivos, condenatórios, mandamentais etc.), não se pode acolher a alegação de que a demanda tenha sido aforada com base na eqüidade ou com objeto juridicamente impossível.

(....)”

(In: MANUAL DO PROCESSO COLETIVO - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 211)

Os detalhes técnicos que aparentemente tornam juridicamente impossível o processamento desta actio popularis serão tratados individualmente, acompanhando as paraconsistências (contradições não triviais) envolvidas.

Dispõe o artigo 47 do Código de Processo Civil, in verbis:

“Art. 47. Há litisconsorte necessário, quando, por disposição de lei ou pela natureza da relação jurídica, o juiz tiver de decidir a lide de modo uniforme para todas as partes; caso em que a eficácia da sentença dependerá da citação de todos os litisconsortes no processo.

Parágrafo único. O juiz ordenará ao autor que promova a citação de todos os litisconsortes necessários, dentro do prazo que assinalar, sob pena de declarar extinto o processo.”

Neste sentido, peticionou este Cidadão Apelante, conforme exordial e Aditamento sob protocolo DEPRI 18.10FZPUB/AC.TRB-29-Set-2004-031167-1/3, pois dimensiona o pólo passivo na medida dos interesses envolvidos.

Por não ter sido oportuna e adequadamente processada e conhecida a demanda em primeira instância restou em muito prejudicada a argumentação deste Cidadão - e a defesa dos interessas da Cidadania - no sentido de corrigir os atos administrativos reportados na exordial, Aditamento e petição em andamento, sendo então jurisdicionalmente apreciados de forma equivocada na r. Sentença de fls. 25-26.

As regras constitucionais e legais que garantem o devido processo para defesa dos direitos da Cidadania restaram prejudicadas na prestação jurisdicional monocrática, merecendo revisão por este Egrégio Tribunal, numa interpretação pluralista e procedimental da Constituição Federal, como ensina o professor titular de Direito Público e de Filosofia do Direito da Universidade da Augsburg-RFA, PETER HÄBERLE, na versão brasileira ministerial de GILMAR FERREIRA MENDES, in verbis:

I. Situação atual da teoria

Da interpretação constitucional

A teoria da interpretação constitucional tem colocado até aqui duas questões essenciais:

- a indagação sobre as tarefas e os objetivos da interpretação constitucional, e

- a indagação sobre os métodos (processo da interpretação constitucional) (regras de interpretação).

Não se conferiu até aqui maior significado à questão relativa ao contexto sistemático em que se coloca um terceiro (novo) problema relativo aos participantes da interpretação, questão que, cumpre ressaltar, provoca a práxis em geral. Uma análise genérica demonstra que existe um círculo muito amplo de participantes do processo de interpretação pluralista, processo este que se mostra muitas vezes difuso. Isso já seria razão suficiente para a doutrina tratar de maneira destacada esse tema, tendo em vista, especialmente, uma concepção teórica, científica e democrática. A teoria da interpretação constitucional esteve muito vinculada a um modelo de interpretação de uma ‘sociedade fechada’. Ela reduz, ainda, seu âmbito de investigação, na medida que se concentra, primariamente, na interpretação constitucional dos juízes e nos procedimentos formalizados.

Se se considera que uma teoria da interpretação constitucional deve encarar seriamente o tema ‘ Constituição e realidade constitucional’ - aqui se pensa na exigência de incorporação das ciências sociais e também nas teorias jurídico-funcionais, bem como nos métodos de interpretação voltados para atendimento do interesse público e do bem-estar geral -, então há de se perguntar, de forma mais decidida, sobre os agentes conformadores da ‘realidade constitucional’.

2. Novo questionamento e tese

Nesse sentido, permite-se colocar a questão sobre os participantes do processo da interpretação: de uma sociedade fechada dos intérpretes da Constituição para uma interpretação constitucional pela e para uma sociedade aberta (von der geschlossenen Gesellschaft der Verfassungsintepreten zur Verfassungsinterpretation durch und für die offene Gesellschaft).

Propõe-se, pois, a seguinte tese: no processo de interpretação constitucional estão potencialmente vinculados todos os órgãos estatais, todas as potências públicas, todos os cidadãos e grupos, não sendo possível estabelecer-se um elenco cerrado ou fixado com numerus clausus de intérpretes da Constituição.

Interpretacão constitucional tem sido, até agora, conscientemente, coisa de uma sociedade fechadª Dela tomam parte apenas os intérpretes jurídicos ‘vinculados às corporações’ (zünftmässige Interpreten) e aqueles participantes formais do processo constitucional. A interpretação constitucional é, em realidade, mais um elemento da sociedade abetª Todas as potências públicas, participantes materiais do processo social, estão nela envolvidas, sendo ela, a um só tempo, elemento resultante da sociedade aberta e um elemento formador ou constituinte dessa sociedade (... Weil Verfassungsinterpretation diese offene Gesellschaft immer von neuem mitkonstituiert und von ihr konstituiert wird). Os critérios de interpretação constitucional hão de ser tanto mais abertos quanto mais pluralista for a sociedade.

(In: HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL - A SOCIEDADE ABERTA DOS INTÉRPRETES DA CONSTITUIÇÃO: CONTRIBUIÇÃO PARA A INTERPRETAÇÃO PLURALISTA E ‘PROCEDIMENTAL’ DA CONSTITUIÇÃO, Sergio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre, 2002 [reimpressão], p. 11-13)

Do exposto, inspirado nas lições de Direito deste Egrégio Tribunal, na Oração à Primeira Turma de Filosofia, proferida em 1937 por JULIO DE MESQUITA FILHO (*) e na CARTA ABERTA À SOCIEDADE, assinada por WALDENYR CALDAS, ALBERTO CARLOS AMADIO, VAHAN AGOPYAN, MARIA ANGELA F. PEREIRA LEITE, TEREZINHA DE J. ANDREOLI PINTO, GUIDO FERNANDO SILVA SOARES, MARIA TEREZA LEME FLEURY, SELMA GARRIDO PIMENTA, SEDI HIRANO, GIOVANNI GUIDO CERRI, CÁSSIO XAVIER DE MENDONÇA JUNIOR, NEY SOARES DE ARAÚJO, MÁRCIA ERNESTO, JOÃO STENGHEL MORGANTE, HENRIQUE KRIEGER, GIL DA COSTA MARQUES, COLOMBO CELSO GAETA TASSINARI, FRANCISCO CESAR POLCINO MILIES, BELMIRO MENDES DE CASTRO FILHO, HERMAN CHAIMOVICH GURALNIK, JOSÉ ROBERTO POSTALI PARRA, JOSÉ BENTO STERMAN FERRAZ, ISABEL AMÉLIA COSTA MENDES, MARIA DE LOURDES PIRES BIANCHI, FRANCISCO DE ASSIS LEONE, AYRTON CUSTÓDIO MOREIRA, MARISA SEMPRINI, MARIA FIDELA DE LIMA NAVARRO, FRANCISCO ANTONIO ROCCO LAHR, PLÁCIDO ZOEGAS TÁBOAS, ROBERTO MENDONÇA FARIA, DOUGLAS WAGNER FRANCO, MURILO DE AZEVEDO MARX, WILSON TEIXEIRA, MARTA MONTOVANI, REYNALDO LUIZ VICTORIA, GERALDO FRANCISCO BURANI, ISTVAN JANCSÓ, CARLOS AUGUSTO GONÇALVES PASQUALUCCI, JOSÉ FERNANDO CASTANHA HENRIQUES, MARCOS VINICIUS FOLEGATTI, WAGNER E. PAIVA AVELAR, DAGOBERTO DARIO MORI, EDSON DOS SANTOS MOREIRA, ANTONIO APRIGIO DA SILVA CURVELO, ANTONIO CALIRI, MARCOS JOSÉ SANTANA, HILTON THADEU Z. DO COUTO, GO TANI, PAULO CÉSAR MASIERO e CREMILDA CELESTE DE A. MEDINA (Folha de S. Paulo, 19.7.2004, anexa), requeiro a reforma da r. Sentença, com o retorno dos autos ao juízo a quo para o devido processo legal.

São Paulo, 17 de novembro de 2004
182º da Independência, 115º da República Federativa do Brasil,
100º do Tratado de Petrópolis e 70º da UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

 

Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649

(*) Em anexo, publicado no jornal O ESTADO DE S. PAULO, 25.01.2004, p. U-5, com destaque para o seguinte parágrafo, in verbis:

“(....)

A vossa escola surgia, assim, como o molde indispensável onde se fundiriam os futuros modeladores da juventude nacional. Nela se formariam os espíritos em condições de criar e praticar uma doutrina educativa que tivesse em vista, acima de tudo, como queria um grande espírito francês, assegurar a seleção de capacidades, alevantar, no verdadeiro sentido da palavra, todos os espíritos, só pensar naquilo que moraliza, que não traduz lucro imediato, que leva o olhar a fixar-se alto e longe. Esperavam os seus fundadores que desse foco ardente de ambição desinteressada se irradiasse para todo o País uma concepção nova das coisas e que, combatendo sem desfalecimento a velha e desagregadora idéia do saber pelo saber, implantasse na consciência das gerações de amanhã o sentimento do sacrifício pelo bem da comunidade. Procurando dar consistência material à idéia universitária, tinham em mente os que conceberam dotar o País de um cérebro poderoso e coordenado que, a coberto da transitoriedade dos governos, pudesse gerar os sentimentos, a vontade, a organização e a disciplina intelectual a que os povos verdadeiramente fortes devem as suas melhores vitórias.

(....)”

 


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