"O advogado - Feliz de você, juiz, que pode
seguir no seu trabalho o ritmo regular do horário comercial e ouvir à sua volta, quando
trabalha, o repousante silêncio do tribunal ou o secreto recolhimento da câmara de
conselho. Quando a corte entra, todo sussurro se cala. Seu trabalho se desenrola longe dos
tumultos, sem imprevistos e sem precipitações; você ignora a ansiedade do improviso, as
surpresas de última hora; não precisa quebrar a cabeça para encontrar os argumentos,
porque deve apenas escolher entre os que foram encontrados por nós, advogados, que
realizamos para você o duro trabalho de escavação; e, para melhor meditar sobre a sua
escolha, tem o dever de sentar-se em sua cômoda poltrona, enquanto os outros homens
sentam-se para descansar - sessão (ato de assentar-se) é como se chama, para
você, o período de maior trabalho. Já a lide do advogado não conhece nem horário, nem
trégua. Cada processo abre um novo caminho, cada cliente suscita um novo enigma. O
advogado deve estar presente simultaneamente em cem lugares, assim como seu espírito deve
seguir ao mesmo tempo cem pistas.
Pertencem aos clientes, não a ele, até mesmo suas horas noturnas, que
talvez sejam aquelas em que ele tormentosamente elabora para eles os mais preciosos
argumentos. Ele é, material e espiritualmenente, a inquietação multiforme sempre
alerta, do mesmo modo que você é, juiz, a olímpica imobilidade, que espera sem pressa.
O juiz - (....)"
(In: ELES, OS JUÍZES - VISTOS POR UM ADVOGADO, trad. Eduardo
Brandão, São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 389-390)