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Excelentíssimo
Senhor Desembargador Federal
BAPTISTA PEREIRA
Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região
(TRF3-23/Fev/2001.037558-DOC/UTU3)
Autos nº 1999.61.00.056808-6
Apelação Cível - Ação Popular - Terceira Turma
Apelante: Carlos Perin Filho
Apeladas: União Federal, CEF & Ots.
Carlos Perin Filho, residente na Internet, em www.carlosperinfilho.net
(sinta-se livre para navegar), nos autos do recurso supra, venho, respeitosamente,
à presença de Vossa Excelência, apresentar, em ilustração à Apelação supra
referida, as seguintes matérias e comentários:
Em desenvolvimento terminológico da appellatio, mister
aprofundar as considerações pertinentes à lógica paraconsistente, pois esta é muito
importante para o oportuno e conveniente desenvolvimento do Direito, conforme ensina
CLAUDIA MARIA BARBOSA, in verbis:
"[5] A contribuição da lógica paraconsistente
A lógica deôntica é uma das muitas lógicas desenvolvidas a
partir da lógica clássica, sendo considerada uma lógica complementar a esta. De um
lado, porque observa as principais regras de inferência que caracterizam a lógica
clássica, quais sejam, as chamadas Leis do Pensamento; de outro lado, porque os
operadores de que se utilizam (obrigatório, proibido, permitido), permitem uma maior
capacidade de expressão do que aqueles baseados unicamente na lógica tradicional.
As lógicas complementares alargam o âmbito de aplicação da lógica
clássica. Os operadores que utilizam modificam o aparato lingüístico sob o ponto de
vista sintático, embora não alterem nada de essencial do ponto de vista semântico.
Também neste âmbito, as modificações são suplementares e visam
tão somente a maior adequação às relações sintáticas expressas pelos novos
operadores.
Ao lado dos sistemas lógicos complementares à lógica clássica, há
os chamados sistemas divergentes, rivais daquela, como aqueles denominados sistemas
lógicos paraconsistentes, os quais tem sido desenvolvidos com o propósito de substituir
os sistemas clássicos em determinadas situações, onde a lógica clássica tem se
mostrado insuficiente.
Algumas dessas lógicas paraconsistentes - as mais conhecidas -
distinguem-se da lógica clássica exatamente por derrogarem pelo menos um de seus
princípio (sic), os quais indicou-se anteriormente por Leis de Pensamento.
A primeira destas lógicas heterodoxas denomina-se lógica
não-reflexiva, e caracteriza-se por colocar em cheque o princípio da identidade.
Uma segunda lógica é a denominada paracompleta; nesta, a lei do
terceiro excluído é derrogada, admitindo-se Conseqüentemente que duas proposições
contraditórias, A e ~A sejam ambas falsas.
Ao lado destes sistemas paracompletos, há as lógicas
paraconsistentes, cuja base é a derrogação do princípio da contradição.
Um sistema lógico estruturado conforme o princípio da contradição
afirma de duas proposições A e ~A que, se uma for verdadeira, a outra é falsa.
No esquema exposto por Newton DA COSTA, uma teoria dedutiva T, cuja
linguagem contenha um símbolo para a negação, é dita inconsistente se o conjunto de
seus teoremas contém ao menos dois deles, um dos quais sendo a negação do outro. Sendo
A e ~A tais teoremas, ambos integrantes de um mesmo sistema lógico, apresenta uma
contradição. A teoria T chama-se trivial (ou supercompleta) se todas as proposições
formuláveis em sua linguagem forem teoremas de T, ou dito de outra forma, se tudo o que
puder ser expresso na linguagem T puder ser provado em T.
Inconsistência e trivialidade não significam a mesma coisa, mas no
âmbito da lógica clássica são considerados conceitos equivalentes, uma vez que um
deles implica o outro.
Assim a presença de uma contradição trivializa T, ou seja, se em um
único sistema de lógica clássica forem derivadas duas sentenças, uma das quais sendo a
negação da outra, então qualquer sentença exprimível na linguagem T pode ser derivada
em T.
Dito de outra forma, nas lógicas ditas clássicas, em geral, é
válido o princípio ex falso sequitur quod libet, formalmente expresso pela
fórmula (A & ~A) - > B, que indica que "de uma falsidade, tudo se
segue". Ou, tomando-se em consideração a idéia da contradição, "de uma
contradição, qualquer coisa pode ser concluída".
Se tudo se pode concluir de uma falsidade ou de uma contradição,
pode-se provar qualquer coisa, e será impossível distinguir o falso do verdadeiro, de
forma que, desde o ponto de vista da lógica clássica, um sistema trivial é inútil,
porque se a partir dele tudo se pode afirmar, ele não acrescenta nenhuma informação.
As lógicas paraconsistentes buscam obstaculizar essa implicação
entre inconsistência e trivialidade, de forma que em um sistema se possam admitir
determinadas contradições sem que com isso se "contamine" o sistema como um
todo. São portanto sistemas lógicos capazes de fundamentar teorias inconsistentes e não
triviais. Assim, admite-se proposições contraditórias sem que por isso o sistema perca
seu valor científico.
Em um artigo denominado Normative Logics, Morality and Law,
Leila Zardo PUGA, Newton da COSTA e Roberto VERNENGO partem de duas constatações que por
si só, defendem eles, justificam a utilização de sistemas lógicos paraconsistentes no
direito.
De um lado, entendem que em sua grande maioria, os corpus
normativos legais, que compõem em grande parte o arcabouço legislativo de direito
contemporâneo, contêm normas que implicam contradições; por exemplo, uma mesma ação
é regulada como obrigatória e, ao mesmo tempo, como proibida. Ou então, em certas
circunstâncias, uma mesma ação é de um lado caracterizada como obrigatória e ao mesmo
tempo como não devida (proibida).
Estas circunstâncias ficam mais evidentes quando está-se frente a
dilemas deônticos, caracterizados quando uma pessoa deve cumprir uma ação que ela, ao
mesmo tempo, não está obrigada a desempenhar.
Assim, por exemplo, no caso de aborto espontâneo, particularmente
quando o feto e a mãe competem pela sobrevivência, isto é, quando apenas um deles
poderá sobreviver. Está-se diante de um dilema moral, e estes normalmente ensejam
conflitos normativos que um ordenamento comumente não consegue resolver.
A segunda aplicação vislumbrada pelos autores citados diz respeito
às lacunas legais e aos muitos conceitos vagos e ambíguos de que se utiliza o direito -
e não só ele - na definição de seus conceitos legais.
Em diferentes circunstâncias em que se utiliza um mesmo signo
lingüístico, este adquire diferentes conotações em função de se (sic) uso, das
situações em que é definido, e assim por diante. Sistemas formalizados neste caso
apresentariam a vantagem de contar com a precisão dos componentes do sistema e dos
operadores, formalmente traduzidos, com a vantagem de que, no sistema lógico
paraconsistente, a admissão de uma contradição não faz desmoronar todo o sistema.
Como já foi explicitado, a lógica clássica, e mesmo a lógica
deôntica complementar a esta, não admite contradições sem que com isso todo o sistema
entre em colapso. Dito de outra forma, a lógica clássica não abarca e tampouco admite
contradições que, consideram estes autores, são imanentes entre outras, ao direito e à
moral.
Nesse contexto é que se considera a utilidade das lógicas
paraconsistentes, e especialmente no caso do direito, a lógica deôntica paraconsistente,
que, embora ainda formalmente incipiente, busca justamente a elaboração de sistemas
lógicos que admitam contradições, sem que dessa assunção decorra a trivialidade do
sistema como um todo.
De fato, hoje admite-se que o direito abarca contradições, mas, de
formas variadas, diversos pensadores vem relativizando estes "problemas"
utilizando-se de conceitos variáveis de sistema, de unidade do ordenamento, e da própria
completude do direito.
Admite-se que a coerência é propriedade não do ordenamento como um
todo, mas de suas diversas partes (Tércio FERRAZ JR. Norberto BOBBIO).
Nesse contexto, o desenvolvimento de sistemas deônticos
paraconsistentes pode ser de grande utilidade porque através da formalização torna-se
mais fácil identificar a existência de paradoxos e enunciados que implicam sentenças
contraditórias, as quais a utilização da linguagem natural, por suas limitações, não
revela.
Observa-se que se fala em pluralidade de sistemas lógicos
paraconsistentes. Isto porque, como não há no estudo da lógica deôntica um único
sistema capaz de explicar e formalizar todo o direito, da mesma forma ocorre com as
lógicas paraconsistentes. Não há apenas uma, e tampouco as lógicas paracompletas e
não-reflexivas expressam a totalidade das lógicas heterodoxas.
A discussão quanto ao objeto, à função e distinção das normas e
das proposições normativas, suas estrutura, a possibilidade de aplicação dos
princípio (sic) lógicos às normas, e sua adequada formalização, também estão
presentes quando se tem em conta a perspectiva da formalização de um sistema lógico
paraconsistente.
Também aqui se discutem os operadores que compõe a lógica deôntica,
e a perspectiva de uma lógica multivalorativa que proponha outros valores além do
verdadeiro ou falso, ou mesmo do válido ou inválido, conforme o caso.
A premissa que une as diversas propostas que já apareceram e que
continuam a surgir neste campo, é a possibilidade de construção de uma lógica onde
admita-se a existência de contradição sem que com isso o sistema perca sua utilidade.
Dito de outra forma, uma lógica inconsistente, mas não trivial.
É nesse sentido que pode estar se abrindo um novo caminho para que
(sic) o direito, mesmo com contradições e lacunas que traduzem a própria complexidade
das relações sociais. Nessa perspectiva, a lógica deôntica paraconsistente passa a ser
instrumento importantíssimo de análise do próprio direito e da ciência
jurídica."
(In: PARADOXOS DA AUTO-OBSERVAÇÃO - PERCURSOS DA TEORIA JURÍDICA
CONTEMPORÂNEA, organizado por LEONEL SEVERO ROCHA, JM Editora, Curitiba, 1997, p.
89/92)
A lógica paraconsistente, na teoria e na prática supra
exemplificadas, repercute na metodologia científica também do Direito Administrativo, ao
conferir estruturas lógicas novas aos seus métodos, conforme ensina JOSÉ CRETELLA
JÚNIOR, in verbis:
"Capítulo XV
METODOLOGIA DO DIREITO ADMINISTRATIVO
127. O problema do método
O direito administrativo utiliza-se de método próprio,
para a estrutura de seus institutos.
Método é o caminho que o espírito humano percorre para
atingir o objeto. É o conjunto de regras que disciplinam a razão,
orientando-a para o conhecimento da verdade.
O procedimento metódico, que se contrapõe ao casual, conduz
o sujeito cognoscente ao objetivo visado, evitando-se desse modo a tentativa
assistemática, o caminho inadequado, que acarreta inútil perda de tempo e afastamento
progressivo da verdade, podendo ser o método comparado a um mapa preciso que
indica a verdadeira rota, sem divagações, levando dentro de pouco à identificação dos
termos do binômio sujeito-objeto, ao contrário da indefinida informação oral, dada por
um leigo, que apenas por coincidência guiará o caminhante ao ponto exato que pretende
alcançar.
Cada ciência pesquisa as características de determinado tipo de
objeto (aspecto formal), havendo muitas ciências que consideram o mesmo objeto (aspecto
material), sendo o primeiro aspecto - o formal - que torna diferente uma ciência de
outra.
Cabe à metodologia investigar e descobrir qual dentre os
vários processos racionais é peculiar a uma dada ciência. Assim, Metodologia é
a ciência que descobre o método com que cada ciência deve trabalhar para atingir seu
objeto. É a ciência da seleção do método adequado.
Assim como nas ciências físico-naturais há um caminho que se adapta
aos objetos do mundo físico (objetos naturais), também nas ciências jurídicas e
sociais existem categorias especiais de métodos que se flexionam ao mundo cultural em que
outros objetos se movimentam. E, do mesmo modo que, na maioria das vezes, não é
indiferente a escolha de via terrestre, marítima ou aérea, para chegar a determinado
tempo, inacessível, a uma das vias indicadas, no mundo das ciências é preciso também
descobrir quais as rotas mais compatíveis para a apreensão dos diferentes objetos.
Que tipo de objeto é o direito? Que método ou caminho
deve ser empregado para captá-lo do mundo mais completo possível?
Tais indagações competem à filosofia do direito, que auxilia os
diversos ramos do direito, na perseguição exata e completa de seus respectivos objetos.
Depende de duas circunstâncias a eleição do método em
questão: do fim que se pretende alcançar e da natureza da disciplina a que
deve aplicar-se.
Teoricamente falando e levando-se em consideração os diferentes
momentos do trabalho científico, admitem os métodos, em geral, uma tríplice
classificação: a) métodos de pesquisa; b) métodos de
sistematização; c) métodos de exposição.
Os métodos de pesquisa dirigem-se aos objetos para depois
receber formalização em juízos certos ou prováveis.
Os métodos de sistematização e os de exposição
trabalham com os resultados alcançados pelos primeiros, contribuindo para divulgá-los.
Há muitas outras espécies de métodos, como os discursivos ou
de inferência mediata e os intuitivos ou de inferência imediata.
Consiste o método discursivo numa série de esforços
sucessivos em torno do objeto para envolvê-lo, mediante uma série de proposições que
se encadeiam, progressivamente.
Consiste o método intuitivo em operação integral, única e
indivisa do espírito, que se projeta sobre o objeto e o domina, abrangendo-o numa
panvisão, sem que nada - nenhuma proposição, nenhum juízo - se interponha entre o
sujeito cognoscente e o objeto cognoscível.
O método discursivo compreende não só a dedução, que parte
de uma verdade ou princípio geral e chega a uma verdade individual e limitada, havendo,
pois, uma espécie de descida entre um princípio e uma conclusão verdadeira, como
também a indução, que segue o caminho inverso, partindo do caso particular para
consubstanciar-se em um princípio geral. Divide-se a indução em aristotélica e baconiana.
Os métodos de inferência imediata estão reunidos sob o
título genérico de métodos intuitivos.
Intuição, em sentido lato, é a "visão direta do objeto
pelo sujeito", é o "contato integral e imediato dos dois termos do binômio
sujeito-objeto", a tal ponto que, nada se colocando de permeio entre ambos, é
possível a mais perfeita identificação de quem procura com o objetivo procurado.
A intuição pode ser sensível e espiritual,
compreendendo esta última, a intelectual, a emotiva e a volitiva.
Há ainda várias outras modalidades de intuições: a de Bergson, a de Husserl.
Por esta simples apresentação não é difícil concluir como é
complexo, em filosofia, o problema do método e da metodologia."
(In: CURSO DE DIREITO ADMINISTRATIVO - DE ACORDO COM A
CONSTITUIÇÃO VIGENTE, Forense, 15ª ed. p. 175/7)
Para concluir esta abordagem terminológica sobre o método e a
evolução científica, mister manter o espírito jurídico aberto para novas percepções
fenomenológicas, pois "O método é tão infinito quanto a própria ciência"
como ensina EUGEN EHRLICH (cf. FUNDAMENTOS DA SOCIOLOGIA DO DIREITO, Unb, 1986, p. 388,
trad. RENÉ ERNANI GERTZ), e "Talvez seria melhor limitarmo-nos a conceber esta
maneira particular do pensamento jurídico como um estilo deste pensamento, que constitui
uma individualidade cultural da caráter próprio. Este estilo foi se formando no curso de
séculos e foi acentuado, às vezes mais, às vezes menos. Com o termo "estilo"
já estaria dito que não se pode separar este caráter do conteúdo, do pensamento, que
é efetivamente a maneira na qual este pensamento é exercitado em nossa comunidade
cultural. Entra-se neste estilo como que crescendo para dentro dele e a formação
jurídica é um conhecido testemunho como sucede este crescer para dentro. Este estilo se
situaria numa íntima relação de troca com as correntes fundamentais políticas,
espirituais e científicas de cada época, incorporando e elaborando os momentos mais
fortes destas correntes fundamentais. Este estilo não seria, portanto, algo apriórico,
mas parte da cultura global de um contexto jurídico, assim como o direito mesmo também
é apenas parte desta cultura. Pode-se, portanto, aceitar sem mais que em outros contextos
jurídicos se formou um outro estilo de trabalho jurídico e de pensamento jurídico, sem
que, no entanto, se tenha que tentar relacionar os estilos ou harmonizá-los de alguma
maneira entre si. Tais tentativas também não se fariam em relação com a história de
povos individuais e seus contextos culturais.", como ensina JAN SCHAPP (cf. PROBLEMAS
FUNDAMENTAIS DA METODOLOGIA JURÍDICA, Sergio Antonio Fabris Editor, Porto Alegre, 1985,
trad. ERNILDO STEIN).
Do exposto, requeiro o regular andamento desta actio popularis.
São Paulo, 23 de fevereiro de 2001.
179º da Independência e 113º da República Federativa do Brasil
Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649
E.T.: Nome e assinaturas não conferem frente aos documentos
apresentados com exordial em função da reconfiguração de direito em andamento, nos
termos da Ação Popular nº 98.0050468-0, 11ª Vara Federal de São Paulo, ora em grau de
Apelação, sob a relatoria do Desembargador Federal ANDRADE MARTINS, em autos sob nº
2000.03.99.030541-5 - www.trf3.gov.br -
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