Petição na Apelação da Ação Popular
da Compensação dos(as) Escravos(as)

Home Page

 

Excelentíssimo Senhor Desembargador Federal
SOUZA PIRES - Quarta Turma -
Egrégio Tribunal Regional Federal da Terceira Região

 

 

(TRF3-17/Out/2000-12:38
2000.248337-MAN/UTU3)

Autos nº 1999.03.99.066283-9

Apelação Cível - Ação Popular

Apte.: Carlos Perin Filho

Apda.: União Federal e Ot.

Carlos Perin Filho, residente na Internet em www.carlosperinfilho.net, nos autos do recurso supra, venho, respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, apresentar, em ilustração à Apelação supra referida, as seguintes matérias e comentários:

A primeira ilustração, sob direção de redação de MINO CARTA, editoria de REIMUNDO RODRIGUES PEREIRA, com destaque para os seguintes parágrafos, in verbis:

"COMPORTAMENTO/RACISMO:

o processo de marginalização dos negros

A herança do cativeiro

Desde a libertação dos escravos, em 1888, as elites do País criaram modelos descriminatórios, como a ideologia do branqueamento, marginalizando assim as camadas não-brancas nos níveis econômico, social, cultural e existencial

É comum se ouvir dizer que o Brasil é a maior democracia racial do mundo. E que isso ocorre porque o colonizador português apreciava o relacionamento sexual com raças ‘exóticas’, favorecendo a miscigenação.

Atrás desses argumentos se esconde a realidade dos mecanismos de resistência à ascensão social que foram criados contra determinados segmentos discriminados da população brasileira, como os negros e outras camadas não-brancas. E mais: não se vê que esses segmentos populacionais eram componentes de uma estrutura escravista, inicialmente, e, em seguida, de um modelo de desenvolvimento sócio-econômico determinado.

Para compreender melhor a questão devemos analisar certas particularidades no processo de formação das classes sociais no Brasil. É idéia corrente de que, acabada a escravidão, os negros e pardos ex-escravos foram, automaticamente, formar o proletariado das cidades que se desenvolviam. Iriam compor a classe operária, nos seus diversos níveis e setores. E em pé de igualdade com outras levas proletárias em grande parte integradas por imigrantes. Mas entre os próprios operários estrangeiros já existia o preconceito racial.

Mesmo a imprensa anarquista, de São Paulo e Rio não refletia nenhuma simpatia ou desejo de união com os negros, conforme o levantamento feito pelo professor Sidney Sérgio Fernando Solis. Os jornais anarquistas chegavam mesmo a estampar editoriais nos quais eram visíveis o preconceito racial. Portanto, se, de um lado, os negros saídos das senzalas não se incorporavam automaticamente à classe operária, de outro, surgia no interior da própria classe operária o preconceito de cor. O negro e outras camadas não-brancas não são incorporadas a esse proletariado, mas vão compor a grande parcela de marginalizados decorrente das relações sociais que substituíram o escravismo.

(....)"

(In: RETRATO DO BRASIL, nº 10, POLÍTICA EDITORA, São Paulo, 1984, p. 109, em anexo)

A segunda ilustração, também sob direção de redação de MINO CARTA, editoria de REIMUNDO RODRIGUES PEREIRA, com destaque para os seguintes parágrafos, in verbis:

"POPULAÇÃO/ÍNDIOS: a política indigenista brasileira

Genocídio sem trégua

Desde 1500, as nações indígenas brasileiras vêm sendo dizimadas pela ‘civilização’ branca, através das doenças, escravidão ou extermínio sem trégua pela posse da terra

O destino dos povos indígenas no continente americano, após o descobrimento, podia ser resumido em uma fórmula simples: a liberdade, o direito a uma existência saudável e à autonomia cultural aumentam de acordo com o distanciamento dos brancos. Por isso, a última grande nação indígena das Américas ainda relativamente pura, em 1980, era a dos Ianomami: dez a 12 mil índios que, por viver no extremo norte do Brasil, estavam protegidos da ‘civilização’ pelas enormes distâncias amazônicas, pela mata impenetrável e pela precaução de evitar contatos com os brancos.

Os índios sempre tiveram consciência dessa terrível ‘lei de distanciamento’. Não houve povo, entre as centenas de culturas estabelecidas há milênios na América, que a partir de 1498 não tenha precisado realizar a sua diáspora mata adentro, fugindo ao avanço da ‘civilização’.

No Brasil, os primeiro a fugir forma os índios da costa Sul e Leste, onde a colonização foi mais rápida e mais abrangente. Os Tupinanbá fornecem um dos exemplos mais extraordinários desse êxodo. Logo após 1500, esse povo iniciou um espantoso movimento de migração - o maior de que se tem notícia em tempos históricos na América -, composto por dezenas de milhares de índios, à procura de refúgio na Amazônia. Buscavam, em peregrinação, a ‘terra sem males’, como eles mesmos diziam.

Embora na prática o extermínio indígena tenha prosseguido sem tréguas, no período entre 1500 e 1984 as idéias sobre os índios deram passos de gigante, no Brasil. Os portugueses quando os ‘descobriram’, sequer reconheceram a sua condição de seres humanos. Por algum tempo, os índios foram considerados selvagens sem alma, ‘inábeis para a fé católica’ e que deviam ‘ser tratados e reduzidos a nosso serviço como animais brutos’. Essa situação perduraria até 1537, quando o papa Paulo III afirmou, em bula, que os índios eram homens e assim deviam ser tratados.

Diante disso, as coisas começaram a mudar. Em 1570, uma lei proibia formalmente a escravização dos índios. Mas ainda era necessário torná-los ‘civilizados’, isto é, convertê-los a todo custo à religião e aos costumes dos europeus.

(....)

(In: RETRATO DO BRASIL, nº 13, POLÍTICA EDITORA, São Paulo, 1984, p. 145, em anexo)

A terceira ilustração, na mesma linha da segunda, por fragmentos de introdução e conclusão de artigo de autoria de JOÃO PACHECO DE OLIVEIRA, in verbis:

"Cidadania, racismo e pluralismo: A presença das sociedades indígenas na organização dos Estados-Nacionais

Face ao modelo vigente de organização do Estado, é possível pensar em uma cidadania diferenciada, que permita aos membros das sociedades indígenas serem igualmente participantes plenos da construção da nação brasileira? Esta é a questão que o presente artigo procura discutir, focalizando inicialmente as dificuldades existentes no próprio plano do modelo de organização política que norteou a formação dos estados ocidentais modernos, para em seguida abordar as peculiaridades de sua aplicação ao contexto brasileiro. Para isso é esboçado um breve painel histórico, que discute tanto as representações cotidianas que descrevem a contribuição do índio à cultura e à identidade nacionais, quanto recapitula as diferentes políticas governamentais que sobre ele incidiram no correr de nossa história. Ao final são apontadas algumas perspectivas para a superação dessas dificuldades.

Quando falamos em cidadania estamos pensando em determinados papéis sociais, com um conjunto apenso de direitos e deveres, exercidos pelos indivíduos na qualidade de membros de uma comunidade política, isto é, de uma coletividade que possui uma expressão territorial exclusiva e detém mecanismos próprios de resolução de conflitos e de controle social.

(....) (p. 27)

(....)

Retomando as perspectivas quanto a uma nova modalidade de inserção do índio na nação brasileira, poderíamos dizer, para concluir, que as possibilidades de reconhecimento legal do caráter pluralistas (sic) do país ainda são bastante remotas. Embora os textos legais consagrem a perspectiva de uma atuação assistencial diferenciada do Estado (no plano educacional, da saúde, e no apoio ao desenvolvimento), resguardando, portanto, a especificidade dos usos e costumes das sociedades indígenas, muito pouco disso já foi materializado na administração pública. Certamente avanços significativos dependerão de uma profunda reformulação no órgão indigenista e no seu quadro dirigente, bem como na modificação de seu relacionamento com outros organismos governamentais e de suas parcerias com as entidades não governamentais e organizações indígenas. Ainda que os progressos anotados nos pareçam muito mais avançados no caso dos índios do que no caso dos negro (sic), jamais chegou a ser cogitada sequer a viabilidade operacional de ter no Congresso Nacional representantes da população indígena, cujo mandato decorra de uma indicação e eleição feitas exclusivamente pelos próprios índios." (p. 33)

(In: REVISTA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL nº 24 - CIDADANIA - www.iphan.gov.br - 1996)

Do ilustrado requeiro o regular andamento desta Apelação.

São Paulo, 12 de outubro de 2000.
179º da Independência e 112º da República Federativa do Brasil

 

Carlos Perin Filho
OAB-SP 109.649

 

E.T.: Nome e assinaturas não conferem frente aos documentos apresentados com exordial em função da reconfiguração de direito em andamento, nos termos da Ação Popular nº 98.0050468-0, 11ª Vara Federal de São Paulo, ora em grau de Apelação perante este Egrégio TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA TERCEIRA REGIÃO, sob a relatoria do Desembargador Federal ANDRADE MARTINS, em autos sob nº 2000.03.99.030541-5.

 

 

 


Home Page